sexta-feira, 8 de maio de 2009

* MAIO DE 2008

Versos portugueses em manhãs frias de maio

é meu cansaço que me ergue
no exato momento em que me falta o ar
mesmo que minhas pernas se neguem
meu desejo me faz andar

estanca de repente também meus ais
nenhuma palavra, nenhum gemido, nenhum gosto
minhas dores aportam em meu cais
engulo à seco e disfarço as lágrimas em meu rosto

as vezes para seguir é preciso conviver com a dor
um espinho no pensamento, um punhal preso ao peito
uma luta incessante da escuridão com a cor
como se houvesse pregos toda a noite em que deito

As viagens

minhas viagens partiram todas e não voltaram mais
levaram malas, sonhos e canetas para os cartões-postais
rasgaram os roteiros e disfarçaram o itinerário
mentiram os motivos, as desculpas e os horários

minhas viagens partiram e não levaram nem minha foto

O tanto

meus ombros já não conseguem carregar o peso dos meus sonhos
eles que já foram leves agora pesam mais, ano após ano
lembro ainda quando somente o pensar neles eu arquiteta planos
hoje me causam sono, hoje me causam sono

meus sonhos não morreram
meus sonhos não têm insônia
meus sonhos não têm paciência

o que meus sonhos têm
são abandonos...

Teu beijo café

Teu beijo tipo sabor café me faz ficar atento aos teus gestos
ao teu lado não durmo, ao teu lado desperto minhas intenções mais
verdadeiras
meu amor tem insônia para ficar mais perto de ti

Quirina grita com um sorriso maroto : - Vai açúcar?

Quirina já foi mais doce...

A lua

a lua dorme na varanda
o luar tem a cor dos teus olhos
procuro a lua na hora de navegar
e deito com ela quando quero calma

minha poesia também precisa de sua escrita
e ela sabe e procura novas rimas
vez por outra nos embriagamos
e nos amamos à revelia

ela sabe de todas as minhas fases
e eu sei todas as fases que ela passa
ela entende uma frase minha e cala
ela entenda outra frase e grita

Navegação

o que faz todo o navegar
é uma boca cheia de mar

Afogamentos

quando meu corpo se afoga
minh'alma faz respiração boca a boca

Culpas

A intensidade da culpa está diretamente ligada ao alcance da lupa
e quem desenha a lupa
são os nossos medos

Sedes e estios

O deserto tem como paixão maior a lágrima
areia nos olhos
faz chorar

Quadrinha de lugares inusitados sem reflexão alguma

tem um sol que mora no sofá da sala e não conhece a lua...
tem um raio que na chuva cala...
e tem um sonho que mora numa rua sem saída...

Marketing

amor super-bonder é forçar a barra demais
amor brastemp é uma ficção
amor coca-cola é isso aí mas dá barriga
mas se for bombril poderá ser paixão
amor sem conceito é enganação
- passe o próximo job, proponho.

As linhas e as cores

a linha do fim do túnel tem um carretel só de linhas verdes
mora aí a esperança
quando arrebenta faz lambança...faz barulho
e prende alguém
a linha do fim do túnel chama a vida de trem
e é coração
e o corpo de parada em parada se confunde
a alma sabe qual a derradeira estação
pois existem primaveras disfarçadas em cada chegada

Lareiras

o meu corpo veste roupas novas
minha alma rejeita
não acolhe
ela quer o velho cachecol do tempo
que aquece minhas velhas poesias

Uma cara

Cleomar alimenta-se de lua,
come sol,
bebe mar,
usa rimas na degustação,
doses eternas e encantadas de sabor paixão,
e tem luas meninas como família.
(a distância também une, comenta Quirina).

Desmaios

trêmula a voz
"nós" não admitem cordas cênicas
o trafego alucinante espalha visões incandescentes
o que clareia muito, esconde tudo
o que é espreita, se mostra mais
tão perto é próximo do tão longe
a transparência é um invólucro numa crosta áspera

ainda assim culpam a trêmula voz...

Um menino

minha palavra
é preto no branco
meu cabelo é branco
foi preto
e se a situação é preta
disfarço o branco
e se descolorir for necessário
eu rimo

mesmo com toda a tristeza envolta
vive um menino todo lá dentro

Endereços

alguns remetentes trocaram de cep,
outros, de vida
muitos outros, migraram para os e-mails,
tantos, foram vistos colocando mensagens em garrafas,
depois de bebê-las num gole só

alguns remetentes não assinaram, nem deixaram pistas, nem mapas, nem
referências, nem perfumes
rumaram, alguns, para o sul,
outros, disseram que iriam e comodamente, não foram
alguns tentaram a mega-sena, tantos nem esperaram o sorteio
alguns remetentes perderam o endereço do correio,
outros, do boteco

os remetentes partiram, sumiram, esqueceram, morreram, desistiram,
fico à espera de uma carta que mude tudo, que mude o mundo, que mude
a vida, que mude um coração estagnado

o carteiro passa por mim e nem diz bom dia...deve pensar :- Recebia
tantas cartas e agora a caixa do correio virou um ninho de andorinha

Uma andorinha só não faz verão - muitos menos troca cartas

E por falar em cartas - não ganho nem pife...

Quadrinha esperançosa numa tarde amena de maio

ao tentar a lua dormia na rua, num beco
mas continuava a sonhar sempre com ela
um dia ao acordar viu ao seu lado
a lua a cochilar

Prisma

Um sol aquece a pele fria que se insinua e roça meu desejo
um arrepio desconsertante faz a tua face rubrar encantadoramente
numa revessa, entre a lembrança e o medo, desenhasse o beijo
como se o exato momento fosse o momento único simplesmente

Saudades

as lembranças dançam em bailes em varandas tão perto
o que me protege ao mesmo tempo desconcerta minhas vontades
é impossível querer dar a lua um teto
como não seria certo modificar a posição das estrelas

as lembranças jamais trocam de música
as danças não trocam de lembranças
as músicas não permitem novos passos de dança

assim são os momentos que guardamos: encantadoramente inflexíveis

Um olhar

nada poderia mudar àquele olhar por entre as cortinas
nenhuma palavra, nenhum gesto, nenhum motivo, nenhuma resposta
àquele olhar me seguiria por vários anos de minha vida
e vez por outra eu sentia toda a sua intensidade, que me fazia ver
imagens que há muito eu já desenhava em páginas amareladas pelo tempo
nada poderia mudar àquele olhar
nem mesmo o mesmo olhar tanto tempo depois

Colcha de retalhos

meus amores estão nas entrelinhas de minha poesia
estão cobertos de rimas
estão encobertos por uma poeira fina de nome paixão
juntei tecidos tantos por tantos anos
tecidos suaves, finos, retalhos diversos e seda e chita
costurei uma colcha quente de lembranças
para acalmar meus invernos

Viajares

meus viajares lúcidos bebem nortes bêbados
agora se perder é uma forma de entender a bússola
agora se perder é uma forma de encontrar a estrada
agora se perder é uma forma de falar de amor
meus viajares
bebem quintanares
e partem
o que trinca agora
são copos cheios de sede

Versos e luares

Bebe uma lua que nega o luar
em goles cadentes de lumes "nem sei"
e o barulho dos grilos responde o mar:
- é um céu inteiro
(e na mesa ninguém)

Versos de uma noite. linhas de luz
escombros escondem o que não se diz
a madrugada enfeita e um corpo seduz
um copo trincado de um corpo aprendiz

Sedes inteiras bebem desertos
cobertos por colchas de luares
por certo disfarçam seus antigos mares
pois seus ares carregam um triz possesso

Há tempos

Há tempos
navegar era um ato de remos e lágrimas

Águas que rolavam de rostos
entre ondas que quebravam gritos
e calmarias que encaminhavam barcos

Há tempos
naufragar era um ato de provocar a sede

Hoje mares moram em copos
Imensidão é uma questão de tato

Pedras

encaminhamentos são pedras jogadas pra tentar a construção de um caminho

pedras constroem torres, vez por outra são rainhas
pedras constroem prisões, vez por outra são reis

pedras constroem jogadas
atalhos
escadas

chá de sumiço
cheque mate

um cavalo alado anda em L
e escreve labirinto no tabuleiro

Vozes

meu corpo sorri
depois de muito pranto
solta uma palavra feliz
que virá pássaro
que virá canto

meu corpo se aquece
depois de um frio intenso
solta uma palavra inteira
que virá rima
que virá senso

meu corpo tem desejo
depois de uma tristeza latente
solta uma palavra encantada
que virá claridade
que virá presente

A gaivota

redes e casas
sedes e asas
medos e ventos
segredos e tempos
presentes eternos de folhinhas verdes todos os meses

a esperança é uma menina fiel
que guarda todas as lembranças
para presentear o hoje

Mudanças

No meio da rua o alquimista vira artista
e equilibra a vida entre rolos e garrafas
corre riscos à perder de vista
e prende sonhos em encantadas tarrafas

a lógica está entre a transformação e o destino que passa rápido de
carro, rompendo um sinal vermelho

Canto de Algum Lugar e em Companhia da Felicidade

há um lugar
fácil de encontrar
difícil de compreender
que mora num lugar exato sem saber

a linha descreve o mar
o horizonte encanta a linha
a linha é um "nós" à navegar
aonde a felicidade é chamada de minha

Moradas

mora um terno de linho branco
como fosse encanto
ao lado da lua prata
é um canto do luar
como fosse manto
que cobre docemente a dança
que o terno lembra e dança
no pensamento da moça noite

o eterno agora é a realidade da minha fala
que num silêncio de lua
recita todos os cantares

Canto Primeiro da Felicidade


agora a alma é clara
agora a calma é minha
agora o horizonte toma café na varanda
e prazerosamente descansa a linha

Marcas

Tudo em que em ti tatua marca meu coração também
o tanto por ti é muito mais
perguntas que respondo e nem sei
beijo claro sem nenhum porém


Abril e teus olhos

depois que abril passou
o que não passará?
em olhos de "quero nunca"
bilhete numa gaveta que se fechou

(Quirina abriu um sorriso largo e se pôs a gritar:
- Já era maio, já era maio...)

Andarilho

Meu coração é um viajar andarilho
descrente em toda a estação
se agora me mostrarem um trilho
perguntarei:
- Poderá andar nele meu coração?

"Acidentes acontecem, meu poeta."

Pequena Canção de u'a manhã clara de outono

Teu cobertor sempre aqueceu
e por longas milhas
o meu não queria ser aquecido
sabia que leitura me fazia feliz
e inventei um livro que nunca tinha lido

sentir teu cobertor no meu corpo
é como se um sol forte
aquecesse minha Ilha
e ao mesmo tempo navegasse em teu Porto

Doses de encantamentos

Duas doses a mais de uma noite sem fim
e a tua boca carmim embebeda até a lua
o destino embarcação aporta no teu cais
a flor da pele ressurge no teu olhar jardim
e as águas claras do coração saciam todas as sedes


Declaração rasgada sem tradutor e sem vícios de linguagem

Falamos a mesma língua... beijaria a tua eternamente...

Dualidades

Alguns luares são do sol
luares a princípio são da lua
mas as segundas intenções mudar a maré
e a maré transforma a lua

querer entender de luares
passa por significações que são só tuas

o horário é fuso
coerência está fora de uso
e alguns liquidificadores misturam sentimentos


Linhas de Maio II

Maio à mercê de terminar
um gosto de querer no ar
já invade junho
parece que uma vida nova se guardou
e a água felicidade rega a folhinha
do calendário e do outono

Chamas

para querer não basta apenas a explosão
há que se ter a chama independente da medida
há que se entender de calmarias
e também entender os tufões

o querer tem tempo
eternidade é um risco
correr é tentação
e arranhão pode ter diversas
formas de interpretação

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